segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Os cidadãos de bem e Jesus que provoca ruptura

Jesus de Nazaré, a Boa Notícia para o século 21 (17)


Nós analisamos o texto de Marcos (Mc 2,13-17) que fala da presença de Jesus e seus discípulos num banquete na companhia de “pecadores”. Vimos que rabino Jesus foi criticado duramente pelas sentinelas de bons costumes por ele não se manter no “lado certo”. Na sequência vem o texto em que Jesus de Nazaré avalia a prática de jejum para mostrar a radical novidade do Reino que ele instaura o que provocou ruptura no tecido de bons costumes da época. Jejuar era uma prática muito valorizada entre pelos fariseus e os discípulos de João Batista (cf. Mc 2.18-22).

Mas primeiro como já mostramos, na primeira parte do Evangelho de Marcos, é possível identificar um bloco de narrativos das praticas de Jesus e as reações que essas despertaram nas autoridades (Mc 1,40-3,6). O bloco encerra-se relatando a sua decisão para matar Jesus. O texto que nós vamos examinar agora pertence a este bloco. Só para precisar a nossa leitura e evidenciar que Jesus provoca ruptura, é conveniente recordar sucintamente os episódios narrados anteriormente. 

Na cura de leproso (cf. Mc 1,40-45) Jesus “irado” estendeu a mão e tocou no leproso, assim se fazendo “impuro” e excluído como os leprosos, vistos como impuros e excluídos da convivência humana normal naquele tempo. Na cura do paralítico, o Nazareno, movido pela fé dos que o carregavam, perdoou os pecados do paralítico primeiro, para desconstruir o tabu em voga que considerava doenças como castigo de Deus pelos pecados e proclamar a misericórdia de Deus ao curá-lo (cf. Mc 2,1-12). A reação dos “cidadãos de bem” foi acusar rabino Jesus de blasfêmia. Mais adiante, ao chamar, o cobrador de impostos para segui-lo e ao sentar-se a mesa com ele, Jesus aborreceu a elite intolerante que se mantinha “santa e pura” separando-se dos “impuros e pecadores”! (cf. Mc 2,13-17).

A colocação do texto sobre o jejum (Mc 2,1822) demonstra a coerência das narrativas na sua totalidade. Nem Jesus, nem seus discípulos se mostraram entusiasmados com a prática de jejum. Nisso, não somente os fariseus, mas também os discípulos de João Batista, preocupados com a manutenção dos bons costumes, interpelaram Jesus.

 A resposta de Jesus, é que jejuar é um sinal de tempo de preparação; mas agora, esse tempo já acabou. O que ele faz acontecer com o anúncio e instauração do Reino de Deus com as curas e as interpretações como também as modificações das leis e costumes é algo radicalmente novo na história. É motivo suficiente para festejar.

Entretanto, esses tempos messiânicos não serão permanentes, pois virá o tempo em que o noivo será tirado de entre eles e vão jejuar e lamentar de novo, em toda probabilidade essa colocação refere às perseguições que seus seguidores sofrerão no futuro próximo.

O Nazareno usa duas imagens tiradas da experiência da vida quotidiana para reforçar a inusitada singularidade dos tempos novos que ele inaugura. Não é uma boa ideia remendar roupas velhas rasgadas remendos novos, pois o remendo novo vai fazer o rasgo maior ainda. A segunda imagem usada pelo rabino de Nazaré é de vinho novo que precisa ser guardado em barris novos, se não corre o perigo de perder o vinho e o casco.

O que se pode concluir desta alocução de Jesus é que o amor de Deus vem para salvar o homem concreto, na sua situação de vida e não para manter as estruturas que sugam os seres humanos. Sua originalidade rompe estas estruturas simbolizadas pela roupa e barril velhos. Jesus não veio reformar; ele exige mudança decisiva drástica. E o cristão, como discípulo missionário cidadão consegue, na sua atuação, não provocar ruptura? Ao provocar ruptura ele vai ser perseguido pelos “cidadãos de bem”...

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