Jesus de Nazaré, a Boa Notícia para o século 21 (31)
Jesus a caminho para Jerusalém
O evangelho de Marcos é um documento programático. O leitor tem
percebido que o autor nos conta das atividades de Jesus de Nazaré na primeira
parte da sua obra e na segunda ele nos conta das consequências da sua práxis a
fim de beneficiar a comunidade da fé, que inclui aqueles que seguiram o
Nazareno desde o primeiro século até os nossos dias. Conhecer Jesus é
importante; que este conhecimento leve a um compromisso com a causa de Jesus,
isto é, a instauração do Reino de Deus num mundo que com muita facilidade o
rejeita é mais importante ainda.
Vimos logo no início do Evangelho de Marcos um bloco de textos (Mc
1,40-3,6) estruturado para narrar alguns milagres, entre outros, que rabino
Jesus realizou. Os beneficiários destes milagres ficaram maravilhados e louvavam
a Deus pela força restauradora vindo do próprio Deus na pessoa do Nazareno. Ao
mesmo tempo as elites poderosas, aliados dos imperialistas romanos, que
fiscalizavam e criminalizavam qualquer movimento popular de libertação,
decidiram matar Jesus e iniciaram articular um plano para realizar seu plano
nefasto “na forma da lei”. Isto porque as implicações das transformações que a
práxis de Jesus provocava ameaçavam seu status de privilegiados do sistema
vigente.
Na segunda parte do seu Evangelho Marcos narra a subida de Jesus a
Jerusalém numa técnica literária chamada de “inclusão”. Este seu deslocamento de
Galileia a Jerusalém acontece entre as duas curas de cegos (cf. Mc 8,22-26 e
10,46-52). A primeira, a cura do cego de Betsaida, é um episódio peculiar a
Marcos. O Evangelho não nos informa o nome do curado; ele é levado a Jesus
pelos outros; Jesus o leva para longe, realiza alguns ritos e ele recupera sua
vista gradativamente. Uma vez curado, Jesus despede-o com a injunção de não
voltar para a situação anterior (“Não entre no vilarejo”), em que ele ficava
sem enxergar.
A segunda, a do cego de Jericó
(Mc 10,46-52) tem detalhes diferentes. O cego tem nome (Bartimeu); ele mesmo percebe
a presença de Jesus e pede socorro usando um dos títulos Cristológicos mais
importantes: “Filho de Davi”. Os que estavam ao seu redor procuram calá-lo,
diferente daqueles da cura do cego de Betsaida, que tinham intercedido por ele.
Depois da sua cura, Bartimeu “seguiu a Jesus no caminho”. Vale lembrar que
durante muito tempo os seguidores de Jesus eram conhecidos como aqueles que
seguiam “O Caminho”, antes de receber o nome “cristãos” (cf. At 11,26).
Entre essas duas curas dos cegos nós temos três anúncios da sua
paixão que Jesus de Nazaré faz (cf. Mc 8,30-38; 9,9,30-31; 10,32-34).
Ironicamente, cada anúncio produz “cegueira” crescente nos discípulos quanto a
caminho que Jesus de Nazaré propõe seguir na sua missão de instaurar o Reino de
Deus, como veremos em breve ao analisar os textos (cf. Mc 8,32-33; 9,33-38;
10.35-45.
Para começar analisar os textos: o primeiro anúncio da paixão (Mc
8,34-38 cf. Mt 16,24-28; Lc 9,23-27) é precedido pela profissão da fé de Pedro
(Mc 8,27-33; cf. Mt 16,13-23; Lc 9,18-22). Jesus está na região de Cesareia de
Filipe, depois que ele advertiu seus discípulos para se protegerem do “fermento
dos fariseus”. Ele pergunta aos seus que tinham voltado da sua missão aos
vilarejos da Galileia, sobre o que se dizia no meio do povo a seu respeito.
Eles reportaram que alguns consideravam o rabino de Nazaré João Batista
ressuscitado (Herodes), Elias, Jeremias ou um dos profetas dos tempos antigos.
Aqui Jesus quer saber o que os seus próprios discípulos pensavam
sobre sua identidade. Na boca de Pedro temos a profissão da fé das comunidades
primitivas. Jesus elogia Pedro pela sua abertura à revelação divina. No
Evangelho de Mateus percebemos uma virada eclesiológica, pois essa profissão da
fé é o fundamento da comunidade que o Nazareno está formando (cf. Mt 16,17-19).
Jesus começa ensinar sobre o paradoxal caminho que ele tinha
escolhido; o anúncio e a instauração do Reino de Deus não seguirão a rota que
os empreendimentos dos poderosos deste mundo segue normalmente. Enquanto estes
alcançam suas metas usando força maior para derrotar seus adversários e superar
obstáculos no caminho, o “Filho do Homem” vai entregar sua vida em face de
oposição brutal: perseguição, morte na cruz e ressurreição.
Pedro não se conforme com tal escolha tão inconvencional. Inconformado, ele repreende Jesus. Na hora
Jesus o censura pela sua falta de compreensão da radical novidade que Deus realiza
na história humana na sua própria pessoa. É neste momento que o Nazareno faz o
primeiro anúncio da sua paixão a multidão e a seus discípulos. O Reino de Deus
concretiza-se neste mundo, quando tem que se nega, toma sua cruz, entrega sua
vida por causa de Jesus e do Evangelho deste Reino.
Nenhum comentário:
Postar um comentário